Em sites de fotos antigas e relatos do século passado, é comum ler comentários como “Antigamente era tudo melhor e mais fácil”, “As pessoas eram educadas e se vestiam bem”, “Que saudade daqueles dias de outrora”. Afirmo que os velhos tempos eram perigosos, desconfortáveis e injustos, em que pesem as lembranças de nossa infância, quase sempre luminosas.
Em fotos da primeira metade do século XX, quase todos os homens usam terno (muitas vezes com colete) e chapéu, em todas as estações do ano. Proporcionalmente, veem-se poucas mulheres nas ruas.
A violência doméstica e os preconceitos de raça e opção sexual eram ainda mais comuns que hoje em dia, mas não eram algo que se mencionasse ou fosse objeto de protesto público; pelo contrário, eram escondidos.
O analfabetismo era majoritário em vastas áreas do país. Os votos de cabresto eram a regra nas regiões menos esclarecidas; os candidatos ricos e poderosos influenciavam as eleições.
A poliomielite e a varíola assolavam a população infantil, sem pouparem os adultos; isso sem falar nas outras doenças.
Era muito comum cozinhar e fritar usando banha e outras gorduras animais. Aliás, as frituras estavam mais em moda que hoje.
A expectativa de vida era bem inferior à atual, e a mortalidade infantil mais alta; muitos dos diagnósticos e tratamentos que hoje são acessíveis a muitos nem haviam sido criados.
Protetor solar nem era um conceito presente na consciência das pessoas, incluindo a classe médica.
Os eletrodomésticos se restringiam a um mínimo técnico; qualquer serviço de casa era penoso e consumia muito tempo.
Os carros daquela “era dourada” não costumavam ter ar condicionado, nem direção hidráulica ou câmbio automático. O cinto de segurança era desconhecido, e viajávamos sem o mínimo de proteção nem contra pequenos impactos no trânsito urbano.
Fumava-se cigarro em toda a parte: no avião e nos restaurantes (ali havia as chamadas “áreas de não-fumantes”, onde estes ficavam restritos e nem um pouco a salvo da fumaça), assim como nos locais de trabalho, nos ônibus...
O acesso a informação e comunicação era bem mais limitado até os últimos anos do século XX: a revolução da internet era inimaginável, e quem quisesse falar ao telefone longe de casa ou do trabalho muitas vezes se sujeitava às filas nos orelhões.
A qualidade e variedade da programação de TV, tanto pelo conteúdo quanto pela técnica, era limitadíssima; os filmes estreavam nos cinemas meses depois do país de origem.
Atualmente qualquer celular é dotado de GPS. Ainda no fim do século passado, o único modo de se orientar na cidade ou na estrada eram os mapas, que precisavam ser atualizados e exigiam um mínimo de habilidade para serem úteis.
A variedade de mercadorias disponíveis aumentou muito nas últimas décadas. Ainda em meados do século XX produtos importados eram raros, e quase não havia alternativas de compra – e portanto opções de qualidade – para a maioria dos artigos.
A automação bancária atingiu níveis que eram impensáveis poucas décadas atrás. Valores altos tinham de ser pagos em dinheiro ou cheque, e todos andavam com a carteira recheada, com o risco e desconforto que isso implica.
Por estas e outras, meus caros, não elogiemos demais os “bons velhos tempos” e sejamos gratos pela vida relativamente fácil e segura de que desfrutamos hoje.
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